terça-feira, 13 de março de 2018
Senado avança para votar "Lei
do abate" de pessoas
Mas um projeto de lei que
tramita no Senado estabelece que policiais possam atirar em pessoas que estiverem
segurando uma arma de uso restrito, mesmo que não haja confronto. A proposta
foi apelidada pelo próprio autor, José Medeiros, do Podemos-MT, de “Lei do
abate”.
“O policial tem medo do
enfrentamento porque não possui o equipamento ideal. Quando possui, não recebeu
o treinamento adequado. E o que é pior: ele tem medo dessa política esquerdista
instalada de vitimização do bandido, que protege criminosos e açoita policiais.
Aquela velha máxima do Exército Brasileiro, de ‘atirar primeiro, perguntar
depois’, foi trocada por ‘fique parado’, enquanto se gasta munição, atirando no
chão. Isso porque, se ele mata um meliante, sofrerá sérias consequências
administrativas e judiciais. Do contrário, se um policial morre, nada acontece.
Simples assim!”, afirma o senador, que trabalhou por cerca de 20 anos na
Polícia Rodoviária Federal.
Atualmente, o Código Penal livra
quem provar que agiu em legítima defesa. Ainda assim, o agente poderá responder
na Justiça caso sejam constatados indícios de excesso. O projeto de Medeiros
cria uma espécie de “legítima defesa da sociedade” e transforma o ato de portar
uma arma de uso restrito (ainda que ela não esteja em uso) em motivo suficiente
para que a pessoa seja “abatida”.
“Frise-se de antemão, este projeto
atende a uma necessidade urgente dos corajosos homens e mulheres policiais em
todo o país, que estão amarrados pela burocracia na guerra ao tráfico de
drogas''.
Numa enquete feita no site do
Senado, a proposta tem ampla maioria favorável entre os participantes. Até o
início da tarde desta segunda-feira, havia pouco mais de 30 mil pessoas
apoiando o projeto e apenas 696 contra.
A aparente empolgação com a ideia
de um salvo-conduto para matar quem está com uma arma ilegal pode ser explicada
pelos números da violência no país: em 2016, foram registradas no país 61.619
mortes intencionais – homicídios, latrocínios etc –, um recorde, de acordo com
dados do Fórum de Segurança Pública.
Um ponto adicional, porém, é que
2016 também foi o ano em policiais mais mataram na história:
4.224 vezes, um aumento de 25,8% em relação a 2015. Houve ainda 437 mortes de
policiais no mesmo ano, um aumento de 17,5% em relação a 2015.
“Aberração”
Conselheiro do Fórum de Segurança
Pública, economista e pesquisador do Ipea, Daniel Cerqueira considera o projeto
uma “verdadeira aberração em um estado democrático de direito”:
“Existem princípios universais
consagrados, objetos de duas resoluções da ONU, de 1979 e de 1990, que vão
completamente contra ao que diz esse projeto. Há que se seguir preceitos
básicos de legalidade, legitimidade, de uso da força necessária e proporcional.
A regra é só atirar e matar quando há situação iminente de risco de vida”.
“Quem não lembra do caso no Rio de
Janeiro em que uma pessoa foi morta porque segurava uma furadeira? Isso pode se
tornar ainda mais comum se o policial tiver já esse aval prévio para atirar”.
Para Cerqueira, um projeto como
esse vai estimular os excessos e ainda tende a colaborar com o aumento da
corrupção policial:
“Como vai estar legitimado a matar,
a cometer uma ação extrema, o policial pode usar deste poder para se fortalecer
no mercado de corrupção. Além disso, certamente será um estímulo a mais
equívocos. Quem não lembra do caso no Rio de Janeiro em que uma pessoa foi
morta porque segurava uma furadeira? Isso pode se tornar ainda mais comum
se o policial tiver já esse aval prévio para atirar”.
Questionado se a aprovação do
projeto também não estimularia policiais a “plantarem” armas para justificar
homicídios – denúncias do tipo não são raras em operações da PM –, o
senador José Medeiros diz que o inquérito policial e o Ministério Público
continuariam seguindo normalmente seu trabalho de investigação para verificar
se houve o uso de arma restrita. Ele ainda aposta na filmagem das mortes pelos
próprios policiais, com câmeras acopladas à roupa ou aos capacetes:
“Não creio que essa guerra se torne
mais sangrenta. É preciso que a sociedade, através dos agentes públicos,
retome, a curto prazo, a área de segurança pública. Mas, para isso, nesse
primeiro momento, o combate terá de acontecer de forma igual. Eles conseguem
armamentos que a polícia não possui. Portanto, quem tem tornado a guerra
sangrenta têm sido os traficantes e suas milícias, e não o policial”.
As informações são do repórter Ruben
Berta, do The intercept Brasil
Edição da Agência Baluarte
O projeto de José
Medeiros transforma o ato de portar uma arma em motivo suficiente para que
a pessoa seja “abatida”
Aos que pensam que essa é só mais
uma iniciativa folclórica dos políticos que habitam Brasília, fica o alerta: a
proposta de alteração no Código Penal foi apresentada em setembro do ano
passado e, se aprovada pela CCJ, será enviada à Câmara dos Deputados. Segundo o
autor, a votação na comissão deve acontecer ainda esta semana.
Policial militar aponta arma durante operação na Cidade de Deus, no Rio de Janeiro: Atualmente, o Código Penal livra quem provar que agiu em legítima defesa |
O relator do projeto na CCJ,
senador Wilder Morais (PP-GO), aprovou com louvor a ideia, tecendo rasgados
elogios em sua análise:
Edição da Agência Baluarte
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