terça-feira, 15 de outubro de 2019
CATALUNHA
O auge da tensão ocorreu após às 18h (13h de
Brasília). Nesse momento o único objetivo das polícias era desalojar a praça
central do aeroporto, que pouco a pouco se encheu de milhares de pessoas que
chegaram de trem, metrô e, muitas delas, caminhando de Barcelona. Esse ponto é
crucial às comunicações do aeroporto, já que por ali passam os táxis e ônibus
que pegam os passageiros que chegam ao Prat. Um grande número deles, às 17h
(12h de Brasília), esperava em uma fila de centenas de metros a passagem de um
táxi que nunca chegava, até que precisaram procurar uma alternativa.
A decisão ficou longe das demandas do Ministério
Público, mas endossa a Advocacia Estatal
Quase oito anos de processo separatista na
Catalunha, que culminaram em uma declaração de independência fracassada em
2017, resultaram em sentenças de nove a 13 anos de prisão na segunda-feira para
seus principais impulsionadores e na reativação da ordem de detenção para o
ex-presidente forgido da Justiça espanhola, Carles Puigdemont. O Supremo Tribunal encerrou um dos processos
mais complicados que já enfrentou. E fez isso com condenações, sim, mas
sobretudo lançando uma acusação profunda contra os dirigentes do movimento, a
quem acusa de querer realizar "uma mera quimera" e um "artifício
enganoso" que vem condicionando a vida pública espanhola desde 2012.
A resposta do independentismo foi de absoluta
rejeição da sentença, mas, pelos canais institucionais, foram evitados apelos à
desobediência. Houve protestos a céu aberto nas ruas, especialmente com o
bloqueio do aeroporto de Barcelona por milhares de manifestantes. A sentença
não atende às expectativas de quase ninguém. Estava longe das reivindicações do
promotor, porque o Tribunal não identificou um grau suficiente de violência
para apoiar a existência de um crime de rebelião. Obviamente, não satisfez o
movimento de independência, que já havia anunciado de antemão que só aceitaria
a absolvição dos agora condenados. Por outro lado, está próximo do que a
Advocacia Estatal defendeu, ao optar por não acusar os réus de rebelião,
sedição e desvio de fundos públicos.
As condenações, de qualquer forma, motivaram
importantes protestos de independência nas ruas da Catalunha. O
ex-vice-presidente catalão Oriol Junqueras enfrenta a maior pena, de 13 anos,
por um crime de sedição (motim) com desvio de fundos públicos. Dos outros oito
réus em prisão preventiva, três ex-conselheiros (Raül Romeva, Jordi Turull e
Dolors Bassa) foram condenados por sedição e peculato a 12 anos de prisão. Dois
outros (Josep Rull e Joaquim Forn) foram absolvidos do crime de peculato, e o
tribunal impôs 10 anos e meio de prisão. O ex-presidente do Parlamento Carme
Forcadell enfrenta uma sentença de 11 anos e meio por sedição. Por essa mesma
ofensa, uma sentença de nove anos foi imposta aos líderes da Assembleia
Nacional Catalã e de Òmnium Cultural, Jordi Sànchez e Jordi Cuixart. Os únicos
três réus que foram julgados em liberdade (os ex-conselheiros Santi Vila,
Carles Mundó e Meritxell Borràs) foram condenados a um ano e oito meses de
desqualificação especial e 10 meses de multa com uma taxa diária de 200 euros.
Bloqueio à economia
As convocações de bloqueio à economia espanhola
após a sentença condenatória se focaram a partir das 12h de segunda-feira (7h
de Brasília) no aeroporto de El Prat de Barcelona, no qual milhares de pessoas
foram de diversas maneiras com a intenção de colapsar seus acessos e impedir
seu funcionamento normal. Mais de uma centena de voos precisou ser cancelada
porque suas tripulações foram incapazes de chegar às instalações, onde os
Mossos d’Esquadra e a Polícia Nacional avançaram contra os manifestantes
independentistas com a intenção de recuperar os acessos, fechados durante horas
por estrada, trem e metrô.
Manifestantes protestam
contra condenação de líderes separatistas catalães, e bloqueiam acesso do
aeroporto de Barcelona.
|
Depois vieram os avanços dos Mossos pela “forte
pressão” dos concentrados e para evitar que “entrassem violentamente” no
interior do aeroporto, de acordo com fontes da polícia autonômica (regional).
Foram ouvidas sirenes de seus furgões, balas de borracha foram disparadas e
foram visíveis os avanços para ganhar espaço aos manifestantes, uma operação
criticada por sua brutalidade (pelo menos três jornalistas ficaram feridos) que
continuava em andamento. O Sistema de Emergências Médicas (SEM) atendeu durante
o dia 56 pessoas, a maioria no Terminal 1, e dez delas foram enviadas ao
hospital.
Pela manhã, os cordões de segurança das polícias
nacional e autonômica centraram seus esforços em bloquear o acesso ao grande
saguão em que se concentram os painéis das empresas aéreas e os controles de
segurança, que na segunda-feira amanheceram com uma presença maior da Guarda
Civil. A liberação desse ponto crítico permitiu que o funcionamento fosse
normal até que o fechamento dos acessos durante horas prejudicou seu
funcionamento. A convocação do chamado Tsunami Democràtic, o movimento anônimo —
apoiado pelo Govern (Governo Regional) — que organiza as
mobilizações contra as sentenças do Supremo Tribunal, acabou surtindo efeito.
Empresas como a como Vueling, Iberia e Air Europa precisaram cancelar diversas
rotas pelos problemas que suas tripulações encontraram para chegar ao Prat. E alguns
passageiros, como o jogador do Barcelona Ivan Rakitic, tiveram problemas para
sair do aeroporto pelo bloqueio das estradas. O jogador, meio sorridente, meio
contrariado por sua situação, falava com um membro da Polícia Nacional para
procurar uma saída à complicação enquanto reconhecia: “A estrada está
bloqueada, o que eu posso fazer?”. A situação era parecida para toda a
tripulação de um avião da Emirates que acabava de chegar de Dubai. “Não há
ônibus”, se limitava a dizer um de seus integrantes após explicar o que
acontecia a todo o grupo.
Para entrar na área mais central do aeroporto,
policiais e seguranças pediam a todos a passagem aérea e seu documento de
identificação. Era um processo lento, que às vezes continuava com uma revista
de bagagem. Esse filtro tornou inúteis as passagens falsas que o Tsunami,
através da conta do Telegram, enviou a todos os que quiseram ir ao Prat.
Ao meio-dia um cordão policial impediu o acesso
de independentistas ao saguão principal do aeroporto. Havia transcorrido pouco
tempo desde o pedido do Tsunami à ocupação do aeroporto e as pessoas começavam
a chegar em conta-gotas. O segundo ponto de tensão ocorreu na área que conecta
a linha 9 do metrô com o aeroporto. Os policiais antidistúrbios criaram um
cinturão de segurança que impedia a concentração de avançar. Foi uma área de
tensão durante horas e chegaram a ocorrer confrontos quando alguém esvaziou o
conteúdo de um extintor no lugar. Nessa região dois turistas enfrentaram independentistas
que lhes impediam de passar e outra visitante saiu do tumulto chorando, pela
tensão existente no ambiente.
No lugar, o cordão policial foi aos poucos
diminuindo, até ser retirado quando a grande concentração já se encontrava no
ponto central do aeroporto, que a partir das cinco da tarde se transformou no
principal objetivo dos antidistúrbios, que foram separando as pessoas em
diferentes turmas. Apesar do pedido de não violência, alguns manifestantes
jogaram objetos nos policiais. Outros tentaram evitar ser retirados pela
polícia sentando-se no chão, sob uma chuva leve que começou a ficar mais forte
de tarde. Nos últimos meses, o independentismo se referiu reiteradamente
aos protestos de Hong Kong, onde
milhares de pessoas também tentaram colapsar as instalações aeroportuárias.
Os protestos se repetiram por toda a Catalunha,
onde pela manhã ocorreram numerosos bloqueios de estradas, entre elas a AP-7. Em
Girona, o trem de alta velocidade (AVE) foi interrompido às 14h (9h de
Brasília) após ocorrer uma invasão das vias. A circulação foi definitivamente
suspensa à espera dos técnicos da ADIF (estatal espanhola de infraestrutura)
consertarem os danos causados na infraestrutura pelos objetos queimados nas
vias, de acordo com a empresa ferroviária espanhola RENFE. De noite, milhares
de pessoas protestaram no centro de Barcelona.
CRÍTICAS POR APOIAR A
PARALISIA DO AEROPORTO
Lorena Roldán, deputada do Cidadãos no Parlamento
da Catalunha, criticou uma mensagem do Twitter enviada ao meio-dia de
segunda-feira por Sergi Sabrià, porta-voz do ERC. Roldán lhe perguntou se com
sua mensagem “estava apoiando o boicote de uma infraestrutura essencial ao
Estado”. Sabrià enviou um tuíte que dizia: “Todos em todos os lugares, o tempo
todo! Agora o aeroporto e depois às praças!”, informando sobre o objetivo dos
membros do Tsunami Democràtic: paralisar o aeroporto.
DANI CORDERO
EDIÇÃO DE ANB ONLINE
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